quarta-feira, 28 de julho de 2010

Entrevista de Chico César sobre o Projeto Gente que Encanta

Assessora de Comunicação Gente que Encanta - Conheço um pouco da história do começo do Instituto Casa do Béradêro e de sua relação com Catolé do Rocha e com a irmã Iracy. Mesmo assim, gostaria de saber quais questões subjetivas e objetivas lhe motivaram a investir na implantação da ONG?


Chico Cesar - Há cerca de 10 anos Irmã Iracy, minha professora de música, encabeçava e levava sozinha o Projeto Gente que Encanta. Eu havia conseguido projeção nacional e internacional com meu trabalho musical. E eu já conhecia o projeto Bate-Lata de Campinas (SP), tendo inclusive estabelecido algumas colaborações com eles, e também o pessoal da Orquestra dos Meninos de São Caetano. Inspirado nessas experiências, senti que poderia dar visibilidade, apoiar financeiramente o projeto de Irmã Iracy pelo menos nos primeiros passos, ajudá-la a conceituar. Logo de imediato, ao saber de nossas intenções e do trabalho que já vínhamos desenvolvendo, um renomado médico da cidade chamado dr. Antônio Benjamim me procurou para oferecer o prédio que viria a se tornar nossa sede. Esse foi um momento muito importante para nós pois o edifício necessitava um reforma radical e nos unimos em torno dela, trazendo novos colabores com a arquiteta Cristina Evelise. Paralelamente fomos conseguindo apoios como da Fundação Vitae, que aportou recursos para a aquisição do primeiro grande lote de instrumentos, de e também de franciscanos alemães. Professores da Galícia, na Espanha, tomaram conhecimento do nascente Instituto Béradêro e convidaram uma parte de nossa orquestra para que se apresentasse por lá e também em Portugal. Foi uma experiência gratificante para os que puderam ir pelo contato estabelecido com garotos de língua portuguesa com outros acentos, outras brincadeiras, outra musicalidade. Semelhante e divergente ao mesmo tempo. Depois da visita dos béradêros à Galícia, os professores galegos se cotizaram e também enviaram recursos. Nessa fase, até mais importante que os recursos foi a solidariedade, a visibilidade e a cumplicidade que o projeto foi ganhando.

Assessora de Comunicação Gente que Encanta - Qual sua avaliação da atuação da Casa do Béradêro durante esses quase 10 anos de trabalho na região?

Chico Cesar - Crescemos. Muitos alunos transformaram-se em monitores, em repassadores de conhecimento para os mais novos. Saímos do voluntarismo puro, simples e extemporâneo para ações não-remuneradas, mas encadeadas e conseqüentes.




Assessora de Comunicação Gente que Encanta - O desenvolvimento das atividades do Instituto também se deve a ajuda de voluntários. Parece-me que a população local também tem muito carinho pela ONG e tudo que ela representa. Como você vê a ação destes voluntários e qual a importância deles?


Chico Cesar - A colaboração local e a troca de experiência com grupos de cidades vizinhas como Pombal, Sousa e Cajazeiras tem sido de suma importância para o processo de amadurecimento do grupo. No início tivemos problemas de compreensão de nosso trabalho na cidade pois para muita gente se tratava do "coralzinho de Irmã Iracy" e depois da "escola de Chico César", como se não fosse algo de responsabilidade comunitária. Creio que ainda hoje há um certo equívoco no meio do empresariado local, no sentido de pertencimento. São poucos os que não se eximem de participar e colaborar. Por outro lado, entre os jovens de todas as classes sociais encontramos pessoas dispostas a colaborar, a estender os braços, a botar a mão na massa como se diz. Para se ter uma ideia, há uma verdadeira fraternidade do Instituto Béradêro com o Projeto Xique-xique estabelecido na zona rural da cidade de Catolé do Rocha.

Assessora de Comunicação Gente que Encanta - Gostaria de entender também qual tem sido seu envolvimento com a instituição ao longo dos anos?

Chico Cesar - Sou idealizador e fundador, fui seu presidente e também principal mantenedor por muitos anos. Vejo agora com alívio que o Instituto tem encontrado novos parceiros em diversas áreas, incluindo administração e pedagogia. É maravilhoso ver o pássaro criar asas e ensaiar seus próprios. Continuo como incentivador, sei que sou uma referência positiva para os jovens que procuram o Instituto. Pra onde vou, em minhas viagens pelo mundo inteiro, levo o nome do Béradêro como divulgador do projeto mas também em busca de novas parcerias e de experiências que possam trazer novas luzes pra gente.

Assessora de Comunicação Gente que Encanta – Recentemente a Petrobras virou patrocinadora da Casa do Béradêro através do Projeto Gente que Encanta. Uma notícia que chegou mim é de que a abertura do curso de informática causou o maior tumulto entre a população local. Você acha que este aporte financeiro e institucional da Petrobras era o que faltava para o crescimento da ONG?

Chico Cesar- A chegada da Petrobrás, pelo vulto dos recursos e a possibilidade de organização que nos dá, é um salto. Mas, sem subestimar a importância desses recursos, não podemos esquecer que a Petrobrás é uma marca associada à ética nas ações sociais e uma empresa muito querida pelos brasileiros. Estarmos ligados a seu nome é extremamente positivo, nos avaliza perante a opinião e nos cria estofo para o estabelecimento de novas parcerias com empresas e instituições igualmente gabaritadas. A cidade vê a chegada da marca da Petrobrás com muita alegria e cumplicidade.

Assessora de Comunicação Gente que Encanta - Cursos como o de luteria, operador de áudio e os demais cursos de música como violino, violoncello, violão, etc. estão sendo ministrados com turmas maiores estes semestres e, pelo que consta, eles são os únicos daquela região do sertão. Você conseguiria descrever o impacto de um projeto como este naquela localidade?

Chico Cesar - Catolé do Rocha, desde os anos 50 funcionou como um polo cultural do sertão para os estados da Paraíba, Rio Grande do Norte, Ceará e mesmo Pernambuco por congregar vários estabelecimentos escolares importantes como o Colégio Normal Francisca Mendes, fundado por freiras alemãs fugidas da segunda grande guerra, o Colégio Técnico Dom Vital, fundado por padres capuchinhos, e ainda o Colégio Agrícola, depois fechado pela ditadura militar. Ficou conhecida como a "Cidade que lê". Imagino que a partir da instalação do Instituto Béradêro, ao lado de outras iniciativas como o Projeto Xiquexique, a cidade começa a resgatar sua vocação cultural. Os novos cursos trarão alunos de diversas regiões desses Estados e funcionarão como polo de atração e trocas de experiência. Creio que aí está algo que nem podemos ainda dimensionar os seus resultados.

Assessora de Comunicação Gente que Encanta - Parece até um clichê a pergunta, mas não vou poupá-lo dela, já que a acho importante. Qual o futuro que você espera e prevê para o Instituto?

Chico Cesar - Espero que o Instituto Béradêro, do mesmo modo como aboliu de cara o assistencialismo de suas metas e centrou na educação e sensibilização através da arte, dê um novo salto no sentido de criar consciência e viabilidade profissional para seus educandos. É importante que muitos dos que aprenderam com ele tornem-se de fato seus novos mestres e possam sobreviver do trabalho dentro da própria comunidade.


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